"Porque a vida passou antes que pudéssemos viver."
Vitor Hugo
Para nós, aposentados e ex trabalhadores da Varig, não há muito sentido no calendário que determina a virada de ano entre 31 de dezembro e primeiro de janeiro. Qual a razão? Como se alguém apertasse “pause” no controle remoto, nós fomos congelados em 2006, o ano que para nós nunca terminou. E esses tantos, contra as mais justas razões, persistem apertando a tecla que nos mantêm presos a este ano sinistro. Nesses quase seis anos de tempo vivido e desfrutado pelas pessoas normais – as que podem tocar suas vidas com a renda a que têm direito – o ano de 2006 (e os seguintes) entre nós só terminou para quem morreu.
O Calendário que ordena a humanidade pertence à “Ordem Natural das Coisas”. Mas em nosso país esta ordem está sujeita aos interesses pessoais, circunscritos à geografia do poder.
Congelados em 2006, vimos no calendário dos mortais comuns todas as classes de poder estatal aumentarem (todos os anos) os seus mega salários, deixando as migalhas que caem da mesa para o resto. Liberando “bolsas” e um crédito tipo corda-no-pescoço-logo-ali-adiante, lograram ficar mais quatro anos no poder de onde não pensam em sair. Esse falso pão com o circo Copa/Olimpíadas e eventos mil, dispensa a coreografia de choro de enterro na Coréia do Norte para amestrar a galera. É a Ordem Natural... deles.
Enquanto isso, a nossa estranha bolha do tempo não nos deixando viver como seres normais, sem nos aliviar do custo, acelera um desgaste físico, emocional e espiritual, evidenciando a impotência de um mínimo de controle sobre a nossa própria vida. Poderíamos – era nosso direito, pois pagamos por ele – ter vivido esse tempo congelado desde 2006 com dignidade, sem os atropelos e as aflições que nos impuseram. Hoje é impossível aceitar que essa imposição seja fruto de algo que já é muito grave da parte de agentes públicos – a incompetência. E não é mesmo. É pura maldade e mau caratismo deliberado.
Com o mesmo norte (i)moral que os caracteriza, ao mesmo tempo em que se esquivam de reconhecer e resolver o drama dos ex trabalhadores e aposentados da Varig, não descuidam de seus salários, vantagens (ô palavrinha!), auxílios isso e aquilo, passagens aéreas, cartões corporativos...a lista vai longe. Tudo fruto de deformidade moral feita normalidade legal, segundo a leitura de “ordem natural” dos que se acham os donos da nação.
A fórmula mágica que garante o poder nessas mãos está muito bem explicada nesta citação de alguém que não conheço, mas invejo pela síntese impecável:
“Nesse país chegou-se a um limite de estupidez só comparável aos outros mais atrasados do mundo. A aliança entre os muito ricos e os muitos pobres foi a opção preferencial contra quem trabalha e estuda, quem se esforça e conquista pelo mérito aquilo que geralmente beneficia a todos pois, por legítimo, tende a ser abrangente e a favor de todos.”
A destruição da Varig e as perdas para o país; o desperdício de profissionais de qualidade e o calote nos aposentados, se encaixam como uma luva na citação acima. Anos e anos de um serviço de qualidade e muitos empregos decentes perdidos por essa opção preferencial estúpida, mas muito útil a certo tipo de gente.
Mas...
Apesar de congelados num ano sombrio que teima em não acabar, o nosso papel continua o mesmo. Só deixamos de merecer nossos direitos se nos rebaixamos e concordamos com os que nos maltratam. Pode ser cansativa a repetição: - Nós trabalhamos, contribuímos, cumprimos com nossa parte no contrato. Mas a repetição na busca do que é o direito nunca será suficiente até esse direito ser alcançado. É o que leva à real "Ordem Natural das Coisas".
“Fé é acreditar quando o bom senso diz o contrário.”
Vamos nos libertar de 2006!
Feliz 2012 a todos nós!
JC Bolognese